terça-feira, 23 de agosto de 2016

Funeral


O dia ficou cinza. De alguma forma, quem controlava o tempo também estava triste. A tempestade daquele último momento refletia o meu humor, mas também trazia paz. Aquela água lavava as nossas almas. De alguma forma havia o pensamento que me reconfortava, o de que não houve sofrimento.

Não gosto de surpresas. Nem mesmo das boas. Não demorei muito a perceber que situações inesperadas me deixavam mais nervosa do que a outras pessoas. E admirava a capacidade de amar ser surpreendida. Não foi à toa que o telefonema no meio da madrugada me derrubou. Minha avó materna havia falecido. 

Na prática, eu conheço poucas pessoas que morreram. Talvez, por isso, que a morte seja o enigma que nunca resolvi. A sensação de que nunca mais irei ver alguém me deixa atordoada.  

A vida tem dessas pregar peças. Minha vó não tinha nenhuma doença, era uma das pessoas mais ativas e inquietas que já conheci. E um dia, sem mais nem menos, seu coração parou. Deixando pra trás uma legião de pessoas como legado. 

Amava quando ela me contava todas as aventuras do forró no último final de semana. Aquele que ela não convidava ninguém pra ir junto, mas que não deixava de conseguir pretendentes. Também adorava provoca-la. Era divertido fazer com que ela ficasse brava, porque nunca realmente ficava. Ela se divertia também. Tão doida que só poderia ser minha vó mesmo.  

Nunca era monótono estar com ela. Havia sempre uma história, uma risada, uma ideia maluca. Acho que por isso preferiu ir de uma vez. Sem despedidas, sem enrolação. Quando queria ir, tinha pressa. E também foi assim que ficou mais difícil dar adeus. É triste imaginar um mundo sem a árvore mais antiga e vibrante do nosso pomar.  

É ainda mais triste pensar que foi cedo demais. Ainda havia tanto pra gente rir.